Um dos alvos mais importantes da indústria de alimentos é satisfazer as demandas do consumidor pela oferta de produtos diversificados e de alta qualidade. Este alvo seria inatingível sem o uso de embalagens, tanto que a indústria de alimentos é a sua maior usuária final, contando com 35% da indústria global de embalagem, proporcionando ao mercado consumidor alimentos seguros, de alta funcionalidade e praticidade.
A segurança do consumidor é pauta constante entre os fabricantes de embalagens para o mercado alimentício. Ninguém contesta a importância do tema, sobretudo neste momento em que as boas práticas de produção estão na mira tanto dos órgãos reguladores quanto da população em geral.
A segurança do consumidor e do fornecedor de insumos ao transformador, há um forte comprometimento com o atendimento à legislação, afinal, assegurar a adequação dos materiais plásticos para contato com alimento, em relação à contaminação química, não é apenas teórico, e sim retrata a efetiva evolução da indústria brasileira de embalagens.
Prova desse avanço está nas regulamentações publicadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa): a RDC 51 e a RDC 52, de 26 de novembro de 2010. As resoluções tratam, respectivamente, da migração total de substâncias das embalagens plásticas para os alimentos, e de corantes para embalagens plásticas em contato com alimentos. O que foi feito são atualizações da legislação brasileira, harmonizando o país no âmbito do Mercosul.
As disposições gerais acerca das embalagens plásticas para este tipo de aplicação são antigas; integram o regulamento técnico 105, publicado em 1999. Formado por várias resoluções do Mercosul, ele traz a lista da Anvisa para as substâncias e materiais aprovados para contato com alimentos.
As disposições gerais acerca das embalagens plásticas para este tipo de aplicação são antigas; integram o regulamento técnico 105, publicado em 1999. Formado por várias resoluções do Mercosul, ele traz a lista da Anvisa para as substâncias e materiais aprovados para contato com alimentos.
Essa inquietação teve reflexos no Brasil com a geração da RDC 51, que revoga os anexos I, V, VI, XIII e XIV, e da RDC 52, responsável pela revogação dos anexos IV e X, da resolução 105/99.
Elas podem ser traduzidas como uma evolução destes conceitos estabelecidos há alguns anos, mas a novidade está na republicação dessas duas resoluções.
A Anvisa estendeu para mais 180 dias (contados desde o dia 22 de dezembro de 2010) o período para as indústrias se adequarem às normas estabelecidas. É justo que seja dado um prazo para os fornecedores de insumos, fabricantes de embalagens, usuários e laboratórios se adequarem às novas exigências.
São muitos os ensaios laboratoriais, afirma o pesquisador científico Paulo Henrique Kiyataka, do Centro de Tecnologia de Embalagem (Cetea).
O tempo é suficiente também de acordo com a Anvisa, sobretudo porque o especialista em regulamentação da agência entende que as mudanças propostas não são lá muito drásticas, pois, na verdade, representam um ajuste da indústria e não necessariamente uma inovação.
Elas vão alterar pouco a prática do mercado, pois vieram mais no sentido de manter um alinhamento internacional, tornando o país mais competitivo. De qualquer maneira, todos os elos da cadeia de embalagens concordam que as resoluções representam um aprimoramento incontestável na legislação brasileira.
As resoluções – A RDC 51 estabelece critérios para o controle de migrantes, substâncias, em geral, de baixo peso molecular com mobilidade suficiente na estrutura que permite sua extração ou absorção pelo produto.
Os novos critérios servem para verificar se substâncias prejudiciais à saúde humana estão migrando em teores acima dos autorizados pela legislação, de embalagens e utensílios plásticos para os alimentos.
Entre as mudanças, se destaca a retirada do n-heptano como simulante gorduroso (produto que imita o comportamento de um grupo de alimentos com características semelhantes).
Considerado tóxico e, portanto, sob a alegação de causar malefícios ao consumidor, esse elemento caiu em desuso, sendo imposta sua substituição pela solução de etanol, o isooctano ou o MPPO (óxido de polifenileno modificado).
O impacto dessa alteração para a indústria é direto, pois os produtos analisados com o simulante n-heptano devem ser novamente avaliados com um dos simulantes permitidos. Em outras palavras, laudos antigos não são mais válidos e, portanto, obrigatoriamente serão trocados.
No caso da RDC 52, os corantes passaram por novos processos de análises quanto ao teor da substância nos alimentos. Os critérios, segundo a Anvisa, incluem limites para migração de substâncias das embalagens para os alimentos, e métodos para determinação desta migração, assim como taxas de pureza e níveis máximos permitidos para o uso de alguns corantes.
Destaca-se a inclusão de análises de aminas aromáticas não-sulfonadas, aminas aromáticas sulfonadas, benzidina, b-naftilamina e 4-aminobifenilo em corantes orgânicos e a inclusão de limites para os elementos antimônio e cromo.
As aminas são uma classe de compostos químicos orgânicos nitrogenados derivados do amoníaco e que resultam da substituição parcial ou total dos hidrogênios da molécula por grupos hidrocarbônicos (radicais alquilo ou arilo – frequentemente abreviados pela letra R). Se substituirmos um, dois ou três átomos de hidrogênio, teremos, respectivamente, aminas primárias, secundárias ou terciárias.
As aminas podem ser classificadas como simples (quando os grupos alquil são iguais) ou mistas (se estes forem diferentes).
Quando se usa os prefixos di e tri, indica-se que a amina é secundária ou terciária, respectivamente, e com grupos radicais iguais. Quando os grupos são diferentes, estes são nomeados sucessivamente, do menor para o maior, terminando o nome do composto com o sufixo amina. Algumas vezes indica-se o prefixo amino, indicando, de seguida a posição e o nome do grupo hidrocarbônico.
Outra mudança se refere ao pigmento negro de fumo, para o qual foram alteradas as metodologias para o cumprimento das exigências descritas na RDC nº 17/08.
Também houve uma revisão na análise de migração específica de metais com a inclusão de limites para os elementos prata, boro, flúor e bário e alterações dos limites para os metais cromo, zinco, estanho, cobre, mercúrio, chumbo, antimônio, cádmio e arsênio.
Os laboratórios de análises terão de implantar metodologias de aminas aromáticas, além disso, precisarão investir em equipamentos para atingir os limites de quantificação.
O estabelecimento de um limite de migração específico para o flúor, uma vez que o elemento é adicionado na água da rede pública, e não há estudos capazes de demonstrar a contaminação do alimento por flúor proveniente da embalagem.
Dentre os vários aspectos que demonstram a importância da embalagem, destaca-se a crescente internacionalização e globalização dos negócios que têm impulsionado muitas empresas a reconsiderar os fatores que contribuem para alcançar maior vantagem competitiva.
Uma embalagem inovadora pode mudar a percepção e criar uma nova posição de marketing. Desta forma, verifica-se que a embalagem constitui-se de um negócio atrativo ao mundo industrializado e vem se tornando mais participativa em vários âmbitos, incluindo aqueles relacionados à logística. Este potencial de crescimento deve-se também a outros fatores, tais como os novos estilos de vida e de residências e consumidores ávidos por conveniência.
Com relação a seus aspectos técnicos, a embalagem deve conter, preservar e proteger o produto, além de comunicar-se com o consumidor proporcionando detalhes sobre o conteúdo, tais como preço, capacidade, ingredientes, valor nutricional, instruções de uso e data de validade.
Neste contexto, ressalta-se o uso das embalagens plásticas que têm crescido continuamente devido ao seu baixo peso e excelentes propriedades de barreira, proporcionando maior vida útil e distribuição a longas distâncias.
A possibilidade de combinação com outros materiais associada ao desenvolvimento de tecnologias de acondicionamento cria oportunidades de aplicações muito diversificadas, favorecendo a expansão do uso de plásticos para praticamente todos os tipos de alimentos industrializados.
Apesar da tão bem aceita conveniência oferecida pelos sistemas de embalagem plástica, muitas discussões têm emergido devido às questões de segurança alimentar e a impactos ambientais crescentes causados por estes materiais. O consumidor atual, mais informado e consciente sobre questões de saúde impulsiona o interesse das comunidades científicas e legislativas sobre questões de migração de componentes de embalagens para os alimentos.
Com relação aos aspectos relacionados à redução de impactos ambientais causados pelas embalagens plásticas, medidas legais têm sido implementadas mundialmente, incluindo estudos que viabilizem a utilização de materiais reciclados para contato com alimentos.
O objetivo da reciclagem é permitir que resíduos provenientes de materiais de embalagem entrem novamente na cadeia produtiva, desta forma reduzindo a quantidade de material pós-consumo destinado às diferentes formas de disposição, tais como encaminhamento aos aterros sanitários e à incineração. Além disso, devido à conscientização ambiental, há uma tendência no uso de embalagens ecologicamente corretas, redução na quantidade ou tamanho de embalagem, uso de materiais recicláveis e reutilizáveis.
Contaminação de alimentos por embalagens plásticas
Atualmente, há disponível no mercado mais de 30 diferentes tipos de plásticos, sendo que, diferentes tipos de aditivos são incorporados no processo de transformação destes plásticos, proporcionando melhor desempenho no processamento e nas características finais das embalagens. Alguns exemplos de aditivos incluem antioxidantes, estabilizantes, lubrificantes, agentes anti-estáticos e agentes anti-bloqueio.
Compostos reativos como monômeros, substâncias de partida para a produção de polímeros e oligômeros de baixa massa molar também estão presentes nos materiais de embalagem plástica, geralmente em concentrações baixas tidos como residuais Alguns exemplos incluem estireno, cloreto de vinila, caprolactama.
Além dos aditivos e monômeros residuais presentes nos materiais de embalagem, outros compostos químicos podem estar presentes, tais como produtos de degradação de polímeros e aditivos formados durante o processo de transformação, solventes residuais provenientes de tintas de impressão e outros resíduos químicos empregados no processamento do material de embalagem.
Alguns produtos de decomposição de polímeros incluem benzeno e alquilbenzeno além de outros compostos voláteis, como cetonas e aldeídos.
Assim torna-se bastante claro que embalagens plásticas não são inertes, já que todas estas substâncias se encontram dispersas na matriz polimérica que entrará em contato direto com os alimentos e podem se tornar contaminantes se transferidas aos produtos acondicionados por processos conhecidos por migração.
O termo migração geralmente é descrito como um processo de difusão, que pode ser fortemente influenciado pelas interações entre componentes do alimento e o material de embalagem.
Estas interações podem afetar não somente as propriedades sensoriais dos alimentos acondicionados, como também podem alterar substancialmente as propriedades físicas, químicas e mecânicas dos alimentos e do material de embalagem.
Os fatores que afetam a migração de contaminantes de embalagem incluem a difusão da substância na matriz polimérica, sua solvatação na interface polímero-alimento, sua dispersão na matriz alimentícia, tempo e temperatura de contato.
Solvatação, em química, entende-se pelo fenômeno que ocorre quando um composto iônico ou polar se dissolve em uma substância polar, sem formar uma nova substância. As moléculas do soluto são rodeadas pelo solvente. A solvatação acontece tanto em soluções iônicas quanto moleculares.
Assumindo que a dissolução é um processo de dispersão molecular, isso implica a ruptura de ligações ou forças intermoleculares presentes no soluto, gerando ligações entre as moléculas do soluto e as moléculas do solvente.
Este processo é conhecido como solvatação. Quando o solvente é a água, o processo é denominado de hidratação.
As considerações feitas podem ainda tomar referência a passagem dos íons do estado gasoso para o estado líquido, que ocorre com liberação de certa quantidade de energia denominada energia de hidratação o que constitui um processo exotérmico.
Um exemplo de solvatação é a dissolução da soda cáustica Na(OH), gerando um processo exotérmico.
Solvatação: separação e envolvimento das partículas do soluto pelas moléculas do solvente. solvatar: compostos ionicos se dissolvendo em substancia polares sem formar substancias novas.
Por outro lado, componentes dos alimentos, particularmente gorduras, podem ser transferidos aos plásticos, tais como PE (polietileno) ou PP (polipropileno), aumentando consideravelmente a mobilidade dos componentes dispersos na matriz polimérica, portanto, acentuando a migração de agentes químicos ao alimento contido na embalagem.
A migração é considerada assunto de saúde pública. Por este motivo, muitos sistemas de legislação têm buscado políticas de harmonização, onde as regulamentações ocorrem principalmente por meio de listas positivas, ou seja, listas de substâncias autorizadas e suas restrições de uso.
Apesar da existência de modelos matemáticos que buscam a avaliação e a predição da migração, é importante esclarecer que sua avaliação por meio de análises químicas é insubstituível, tanto para alimentos como para material de embalagem.
Com relação à utilização de embalagens recicladas, deve-se assegurar que o material recuperado tenha pureza suficiente para o contato com alimentos, e que atenda às mesmas especificações existentes para o material virgem.
O principal problema para o aproveitamento de reciclados na fabricação de embalagens para contato com alimentos relaciona-se à capacidade do material polimérico em absorver compostos químicos.
Estes compostos podem ser originados dos alimentos acondicionados, como por exemplo, componentes de sucos de frutas como laranja e maçã, dos adesivos (polietileno e cola) usados como rótulo, das más condições de armazenagem da embalagem pós-consumo (contaminação por óleos, graxas, resíduos orgânicos e do próprio solo) e do mau uso da embalagem pelo consumidor antes do descarte (gasolina, defensivos agrícolas, inseticidas e raticidas, detergentes, desinfetantes e desodorizantes). Todos esses compostos têm sido relatados como contaminantes, especialmente em embalagens PET (politereftalato de etila) pós-consumo.
Diversos métodos têm sido propostos para o tratamento de reciclados com enfoque nas preocupações relacionadas aos resíduos de contaminantes que podem estar presentes nos materiais pós-consumo.
Alguns aspectos envolvem a obtenção de informação sobre a procedência do material pós-consumo, processos de seleção de materiais, tecnologias de descontaminação, obtenção de informação sobre os níveis de contaminação em plásticos pós consumo antes e após os processos de descontaminação.
Devido a estas questões, há uma preferência no uso de reciclados pós-industriais, ou seja, materiais não aproveitados que permaneceram na indústria transformadora e que não tiveram contato com o produto a ser acondicionado, não foram expostos aos sistemas convencionais de disposição de resíduos e que, portanto, não apresentam as contaminações esperadas para materiais pós consumo.
Alguns estudos têm buscado o desenvolvimento de tecnologias de descontaminação de reciclados pós-consumo a fim de obterem materiais de alta qualidade.
A tecnologia de aplicação mais conhecida para reciclados pós-consumo destinados a contato com alimentos são as chamadas barreiras funcionais, atualmente aprovadas no Brasil somente para PET, constituídas de um sistema multicamada com o reciclado de PET presente na camada intermediária.
Desta maneira, não há o contato direto do reciclado com o alimento, reduzindo a possibilidade de migração de contaminantes residuais do material pós-consumo para o produto alimentício.
Com base nas argumentações apresentadas, verifica-se que o desenvolvimento de métodos analíticos se torna fundamental para a obtenção de dados confiáveis que permitirão a correta identificação e quantificação de contaminantes de embalagens.
As informações alcançadas, por sua vez, são essenciais para dar suporte aos órgãos regulamentadores não somente para decisões de aprovação de uso de materiais virgens e reciclados, aprovação de novos aditivos, como também para o gerenciamento do risco à saúde do consumidor.
Métodos analíticos para determinação de contaminantes voláteis provenientes de embalagem plásticas
Conceitualmente, o desenvolvimento de odores e sabores estranhos em alimentos está associado a processos de permeação de substâncias provenientes do meio ambiente para o interior da embalagem, enquanto que a contaminação de produtos por componentes de potencial tóxico provenientes do material de embalagem é decorrente de processos de migração.
Por outro lado, componentes de alimentos quando transferidos ao material de embalagem podem permanecer absorvidos. Este processo pode ocasionar depreciação de qualidade do produto, principalmente pela perda de aroma.
Esta ocorrência específica também é de grande importância para situações de reciclagem quando há intenção de uso do material pós-consumo em aplicações para contato com alimentos, pois compostos absorvidos no primeiro uso passam a ser considerados contaminantes, podendo ser transferidos ao conteúdo da embalagem por migração.
Por conseguinte, os fatores que envolvem o desenvolvimento de métodos analíticos se baseiam nos fenômenos de transferência de massa envolvidos, tipos de alimentos acondicionados, condições de estocagem do produto e condições de uso da embalagem.
Quando procedimentos de reciclagem são empregados, consideram-se também os aspectos de manejo da embalagem pós-consumo antes do descarte, procedimentos de disposição, procedimentos de descontaminação e processos específicos de transformação.
Na prática, devido às dificuldades analíticas encontradas em análises sistemáticas realizadas com alimentos, uma grande parte dos estudos realizados é efetuada com simulantes de alimentos, constituídos por soluções cujo comportamento é representativo para o alimento em estudo. Para isso, é usada a classificação de alimentos segundo a legislação brasileira, na qual os alimentos são divididos em categorias.