O Rota Estratégica da Indústria Agroalimentar 2031, um estudo elaborado pelo Observatório Sistema Fiep (Federação da Indústria do Estado do Paraná) , traçou cinco visões de futuro para o crescimento do segmento no Estado: internacionalização, economia circular, rastreabilidade, produtos orgânicos e desenvolvimento de alimentos funcionais e afins especiais. O estudo apresenta um conjunto de ações de curto, médio e longo prazos para cada uma das visões, que devem ser executadas pelos diversos atores do segmento. O documento foi apresentado na quarta-feira (31), durante o Encontro Paranaense da Indústria de Alimentos, promovido pela Fiep em parceria com os 16 sindicatos industriais do setor.
O coordenador do Conselho Setorial da Indústria de Alimento da Fiep, Roberto Pecoits, afirmou que o excesso de burocracia, a ineficiência do serviço de fiscalização sanitária e o grande desperdício em todas as etapas de produção, industrialização e distribuição, são alguns dos principais desafios que a indústria de alimentos tem pela frente e precisa superar para se desenvolver e melhorar sua competitividade.
Pecoits reclama da falta de clareza da legislação brasileira, principalmente em relação às regras para exportação. “Temos capacidade para ocupar um espaço maior no mercado internacional, mas a indústria enfrenta uma série de barreiras que dificultam a exportação. As legislações não são transparentes”, disse o coordenador. Ele informou que vai “aproveitar a troca de governo para apresentar sugestões que simplifiquem e melhorem a fiscalização e reduzam o desperdício no setor”.
A indústria de alimentos é a mais importante do setor industrial paranaense, com 3.900 empresas responsáveis por 28% do PIB industrial do Estado. É o maior gerador de empregos. São 180 mil postos de trabalho e 500 mil se considerar toda a cadeia agroalimentar. O setor paranaense gera R$ 78 bilhões em receitas líquidas de vendas. O Paraná é o terceiro Estado em faturamento no setor agroalimentar, ficando atrás apenas de São Paulo e Minas Gerais.
A crise econômica e a Operação Carne Fraca afetaram em cheio, de acordo com Pecoits, a indústria de alimentos. “As exportações em 2018 serão menores do que foram em 2017. O setor de carnes foi o mais atingido. O mercado de frango deve registrar queda de 2% a 3%. E ainda não conseguimos mensurar a queda do consumo interno”, avaliou.
O estudo apontou ainda que o custo Brasil é um limitador ao crescimento das empresas, que há uma falta da antecipação do setor para as certificações e demandas do mercado internacional, de capacitação das empresas para a exportação, de escala de produção para atender o mercado externo, entre outros fatores que barram a internacionalização da indústria paranaense.
Os especialistas identificaram quatro fatores críticos de sucesso: modelo de gestão, políticas públicas, qualidade e segurança, e recursos humanos. Segundo o estudo, “o diagnóstico sobre a situação atual e a identificação das barreiras alimentaram as reflexões e permitiram a identificação de 71 ações a serem implementadas em curto, médio e longo prazos.”
GOVERNANÇA
Também há o entendimento da necessidade da construção de um modelo de governança para o setor agroalimentar paranaense, que possa orientar a execução das ações e aproximar e integrar os atores envolvidos.
O modelo contemplará etapas como a definição das estruturas de gestão necessárias ao enfrentamento dos desafios de implementação do planejamento do Rota Estratégico, explicitação de práticas a serem adotadas no modelo de operação de governança e constituição de instâncias de construção coletiva para estabelecimento de rotinas e estratégias que promovam o engajamento dos atores.
A necessidade de se investir na qualificação profissional dos trabalhadores do segmento foi também destacada. “Estamos trabalhando fortemente com o setor de alimentos para oferecer soluções que contribuam com os seus negócios, entre elas está a formação e qualificação profissional”, disse José Antonio Fares, superintendente do Sesi e IEL no Paraná e diretor-regional do Senai no Paraná.
Economia circular é alternativa para atender a demanda de alimentos
Uma das cinco visões de futuro contempla o modelo de economia circular. Um novo conceito que desconstrói a lógica da produção linear e trabalha na perspectiva sustentável, em que o resíduo se transforma em um subproduto em cada etapa da produção.
A economia circular reduz o desperdício de alimentos. De acordo com dados da FAO (Fundação das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), em todo o mundo o desperdício de alimentos nas diversas etapas dos processos de produção, transporte, industrialização, distribuição e armazenagem é de 1,3 bilhão de toneladas por ano, o que seria suficiente para alimentar 800 milhões de pessoas.
O estudo Rota Estratégica da Indústria Agroalimentar 2031 contextualiza a necessidade de o setor investir em gestão, pesquisa, inovação, novas tecnologias e marketing para responder ao desafio de atender à crescente demanda por alimentos. “Até 2050 haverá um aumento de 35% na população mundial e a previsão é que a necessidade de nutrição para alimentar estas pessoas cresça 50%, já que a tendência é haver também uma melhoria do acesso da população aos alimentos”, disse Ariane Hinça Schneider, coordenadora técnica do Observatório Sistema Fiep. Segundo ela, ainda não existem políticas públicas incentivando a economia circular, mas em um futuro próximo a questão estará presente no setor agroalimentar.
A preocupação com a procedência dos alimentos e com o sistema de criação que preserve o bem-estar animal é também cada vez mais presente no consumidor e será determinante na decisão de compra no futuro. Além disso, o estudo aponta também uma crescente demanda por alimentos funcionais, orgânicos e personalizados. “São muitos desafios, mas também muitas oportunidades que as indústrias do setor têm pela frente”, destacou. Ela afirmou ainda que para o desenvolvimento da indústria paranaense são necessárias políticas de estado, e investimentos em pesquisa e inovação.
Empresa antenada com as visões de futuro
As visões estratégicas apresentadas no estudo da Fiep (Federação da Indústria do Estado do Paraná) fazem parte da rotina da SL Alimentos, instalada em Mauá da Serra (Centro-Norte). Há três décadas, ela produz as marcas próprias de aveia da Nestlé, Yoki (General Mills), Quaker, Nutrimental, Frohlich, entre outras. O carro-chefe é a fabricação de aveia sob a forma de flocos, flocos finos, farinha integral, aveia tostada e oat bran (farelo com maior concentração de fibra solúvel). A SL também trabalha com outras matérias-primas, como cevada, centeio, arroz e trigo.
“O modelo de economia circular está 100% implantado nas fases de extração e transformação e estamos com projeto para o descarte”, disse Roberta Meneghel Vilela, diretora administrativo-financeira da SL Alimentos. Hoje, a casca de aveia, principal resíduo da produção, é destinada à indústria de alimentação animal, criatórios de aves para cama de frango, adubo ou é queimada. A partir de 2020, esse resíduo terá outro destino. A empresa está investindo na cogeração de energia com o objetivo de ser autossuficiente. O projeto prevê a produção de três megawatt. O consumo da empresa é de dois megawatt/hora. O excedente será comercializado no mercado livre.
A rastreabilidade também está incorporada no processo produtivo do moinho. “O mercado está começando a olhar para essa questão. Garantir aos clientes de onde foi extraído o produto e como foi produzido é um diferencial competitivo importante”, enfatizou Vilela. Segundo ela, a empresa investe pesado em tecnologia e inovação, por meio de profissionais antenados com as novas tecnologias do mercado alimentício, e parceria com instituições de pesquisa.
A SL também está abrindo novos mercados no exterior. Já iniciaram as exportações para o Japão, África do Sul, Quênia, Chile, Paraguai, Uruguai, Peru, Cuba, entre outros; e novas prospecções vêm sendo feitas. O custo Brasil tem sido um dos obstáculos ao crescimento no mercado externo. “Somos supercompetitivos, mas na hora de colocar o custo Brasil perdemos essa competitividade. Hoje, o custo logístico é um enorme desafio às indústrias paranaenses”, ressaltou Vilela Ela enfatizou ainda a importância desta discussão estar na pauta da Fiep.
Fonte : Aline Machado Parodi / Folha de Londrina